Artigo originalmente apresentado em CONTAF 2013
Autores
Camila da Costa Lima
Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Unesp
Alexandre Gomes Vilas Boas
Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Unesp
Patrícia Yuki Omoto
Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Unesp
Valéria Elisabete Rodrigues
Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Unesp
Elaine Santos
Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Unesp
Stela Mara
Herzog Khede
Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Unesp
RESUMO
A proposta deste trabalho é apresentar o
Projeto Ressonâncias II, suas intenções, experiências dos participantes
envolvidos e o processo de produção de obras que resultaram em uma exposição
itinerante.
Criado e
coordenado pela escultora e professora da Faculdade de Belas Artes da Universidade
de Lisboa, Virgínia Fróis, este projeto ocorreu no atelier de cerâmica do
Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho,
Unesp, entre os meses de Agosto e Setembro de 2012, como uma continuação da
ideia inicial apresentada em Portugal no mesmo ano.
A matéria prima básica para o
desenvolvimento da proposta foi o barro. Mas também, foram combinados ou
fizeram parte do processo de produção outros materiais, resultando na criação
de obras ímpares, carregadas de significados.
Ao apresentar este trabalho e compartilhar
experiências se pretende destacar as possibilidades do fazer cerâmica, além de
propor que o projeto iniciado
em Portugal continue ativo, em diferentes
ateliers, comunidades e escolas.
INTRODUÇÃO
No ano de 2012,
complementando as comemorações do ano de Portugal no Brasil, o Programa de Pós
Graduação da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Unesp sob curadoria da Profa.Dra.Lalada Dalglish, convida a
professora Virginia Fróis, da Faculdade de Belas
Artes da Universidade de Lisboa para compor a exposição Três Poéticas Dissonantes,
juntamente com Ricardo Casimiro e Noemia Cruz.
Diferente dos
dois artistas Virginia Fróis optou por produzir suas obras aqui no Brasil, na
própria Universidade, por meio de um workshop com a participação dos alunos da
graduação, pós graduação e da comunidade. Durante um mês, um grupo com 12
integrantes trabalhou seguindo os conceitos e as orientações da experiente
artista.
RESSONÂNCIA I:
de Portugal para o Brasil
O trabalho Ressonância
I foi apresentando em um projeto que envolvia também outros artistas, no
Convento dos Capuchos, em Portugal, durante os meses de Julho e Agosto de 2012.
Até ser colocado
em prática, este projeto foi planejado por cerca de dois anos através de uma
sequência de processos que envolviam o uso de diversos materiais. Virginia
Fróis deu início às suas pesquisas a partir de uma obra que fez em 2008 nos dez
anos da morte de Jorge Vieira, quando foi convidada junto com outros artistas
para uma exposição coletiva na Casa de Artes Jorge Vieira, com quem iniciou
seus trabalhos na Faculdade de Belas Artes de Lisboa, sendo sua assistente. As
primeiras ideias remontavam a cabeças que se entrecruzavam, e assim realizou
uma obra suspensa, um par de cabeças-urnas (fig. 01). A partir daí começou a
desenvolver o conceito de Ressonância.
Fig. 01: Virginia Fróis, Cabeças
Suspensas, 2008
O projeto teve
início com a realização de um molde de gesso de sua própria cabeça e, a partir
deste, fez cabeças em positivo e negativo, em cera virgem de abelha e argila.
Com estas cabeças prontas passou para mais uma etapa, envolvendo estas cópias
de sua cabeça por uma camada de argila, formando uma espécie de cápsula, que já
quase seca foi cortada, queimada e montada novamente sendo selada com uso
novamente da cera.
Tratou-se de um
trabalho em que um processo leva a outro, desperta outro, pede pela experimentação,
a fusão de materiais e técnicas – uma ressonância. O significado envolvido na
palavra ressonância leva ao entendimento de parte dos conceitos presentes na
produção das obras, conforme cita a própria artista em texto de apresentação de
seu projeto em Agosto de 2012: “Entendo Ressonância
como a relação com um outro. Uma coisa nossa que ressoa no outro
(identificação) e que retorna clara ou por vezes mais complexa.” Este sentido
de ressonância se faz presente no momento de realização da obra e continua
depois da finalização, durante a exposição.
Para a
instalação Ressonância I, Virginia Fróis produziu nove cápsulas, a
partir de um molde de sua cabeça, estas peças foram expostas penduradas por
fios, aproximadamente na altura dos olhos do observador, dispostas lado a lado,
formando um círculo, de modo que os visitantes podiam entrar neste círculo, se
posicionarem frente a elas, habitá-las, senti-las, se comunicarem.
Fig. 02: Virginia Fróis, Ressonâncias I, Convento dos Capuchos,
Portugal, 2012
RESSONÂNCIAS II
Este projeto
teve seu início com um workshop que durou um mês
e resultou com a produção de obras para a instalação Ressonâncias II que compôs a exposição Três Poéticas Dissonantes. Os conceitos e processos presentes neste
processo
de trabalho se basearam nos que
vinham sendo desenvolvidos por Virginia Fróis nos últimos anos e,
principalmente nos utilizados em Ressonâncias
I.
A artista em
suas produções mais recentes também questiona as emoções, os saberes, a posição
do outro, suas obras não são pensadas para serem observadas à distância,
conforme cita Sara Antónia Matos no texto Religare (2012): “É para o trabalho
conjunto sobre a memória, o luto e as experiências sensíveis, próprias da
existência humana, que remete o trabalho da artista, ao lembrar que cada
indivíduo não tem existência isolada”.
Deste modo o
workshop, ocorrido nas dependências da Unesp, foi também uma vivência, um fazer
coletivo, motivado pela experiente artista. Se foi construindo
em cada etapa de trabalho uma relação de união dos participantes, guiados pelo
entusiasmo do fazer artístico que não era mais individual, mas sim um processo
que resultaria em uma instalação com obras de um grupo diante de um conceito. O
objetivo da artista foi promover a partilha, utilizando-se da cabeça como um
objeto de estudo e como forma para criar metáforas relacionadas com questões
anteriores, em um aprendizado com o corpo e que vem do corpo e no momento do
modelar devolver para esta cabeça reflexões e pensamentos.
O trabalho
envolveu as relações entre distintos materiais como gesso, cera de abelha,
argila, engobes, fogo, mas também questões pessoais, sentimentos construídos ao
longo de nossas vidas e que de certa forma, também foram direcionados para o
fazer artístico, como afirma a própria artista em texto de apresentação do
projeto junto a Unesp: “É muitas vezes essa a matéria da arte. Nódulos, vazios,
espaços inacessíveis, que podem ser usados como espaços potenciais para o
desenvolvimento da criação artística, aos quais acedemos de forma muitas vezes
intuitiva dentro dos processos de trabalho.”
No momento de
concepção de uma obra, Virginia Fróis emprega em cada detalhe uma simbologia
que colabora no enriquecimento do contexto final. Para a instalação Ressonâncias
II, a artista completou a montagem da instalação com alguns elementos como
o sal que possui diversos significados, além dos relacionados com questões
pessoais da artista (tinha um avô salineiro), para ela
é um símbolo muito rico, da aliança, ligados aos sentidos, a potência, também
um símbolo de pureza, Cristo foi designado como o sal da terra, e também como
matéria branca cristalizada que irradia luz e também está ligado a água, onde
se dissolve. É ainda um símbolo de
pureza e também de perpetuidade. Também foram usados sinos, que servem como um
alerta para o que de mais terrível nos atravessa em forma de pulsões ou desejos
brutos, e o chumbo preso abaixo das cápsulas de cerâmica representando a
individualidade incorruptível e também como os alquimistas buscavam
desprender-se das concepções individuais para chegar a valores coletivos e
universais. O
sal ganha aqui também uma metáfora em relação ao oceano que separa e une os
países.
O PROCESSO DE TRABALHO: Ideias, Materiais e Técnicas
No primeiro
contato Virgínia apresentou seus trabalhos anteriores através de imagens e
explanação verbal, uma conversa com o grupo, após isto, foi iniciado o processo
de trabalho. O primeiro passo foi a produção dos moldes das cabeças com atadura
gessada, sempre a partir de orientações e com a supervisão da artista.
A próxima etapa
foi o preparo de gesso para reforçar os moldes. Esta etapa foi imprescindível,
principalmente, porque o mesmo molde iria receber a fundição em cera e também
ser moldado em argila. Após a secagem dos moldes, já reforçados, se iniciou a
fundição em cera e posteriormente, também foi usado para a moldagem em argila.
Durante o
processo de trabalho foram utilizados vários tipos de argila incluindo a
terracota vermelha, para ser moldada sobre o molde de gesso e se obter uma
segunda cabeça, de argila. Após um período para secagem o molde foi aberto e se
iniciou os acabamentos da peça em argila agregando talco mineral, mica, óxidos,
engobes.
A próxima etapa
foi a confecção da cápsula - urna, feita a partir da cabeça de cera
confeccionada inicialmente. Como um molde negativo, se colocou sobre a peça de
cera a massa composta por argila em pó, vermiculita e materiais vegetais como
palhas, óxidos, cinzas, chamote, mica. Cada ser humano é diferente do outro,
cada cápsula também é diferente da outra. Cada participante selecionou seus
materiais e confeccionou a sua cápsula. Estas cápsulas, por sua vez, guardam em
si exatamente o espaço da cabeça.
Em ponto de
couro, as cápsulas foram cortadas em partes, para serem retiradas da cabeça de
cera e após estarem secas passaram pelo processo de queima em forno elétrico e
Raku. Após a queima das partes, as cápsulas foram novamente montadas, sendo suas junções seladas em cera e seu
acabamento feito com cera e óleo de linhaça.
Para completar a
exposição foi montada uma mesa com as cabeças em cera e em terracota, algumas
queimadas e outras não, dispostas sobre uma camada de sal grosso. Ainda, em
outro ponto, foram dispostas, também suspensas, outras 7 cápsulas.
Fig. 03:
Ressonâncias II, vista do círculo de urnas com o sal ao centro e da mesa
com cabeças
em argila e cera ao fundo, Galeria de
Artes da Unesp, São Paulo, 2012
CONCLUSÃO
A experiência
adquirida durante o workshop, bem como a convivência com Virgínia Fróis,
permitiram que este projeto continuasse seu desenvolvimento em outras regiões e
envolvendo novos participantes.
Independente da
presença da escultora, mas com a preocupação de manter seus conceitos e
técnicas, o projeto Ressonâncias segue para sua terceira edição, sendo
desenvolvido junto a Universidade de São João del Rei, Minas Gerais, sob
orientação dos integrantes do projeto Ressonâncias II que fazem parte do do Grupo de
Estudos Panorama da Cerâmica e conta com
a participação de estudantes e membros da comunidade local e tem sua exposição programada para acontecer de 07 de
novembro de 2013 à 08 de dezembro de 2013, no Centro Cultural da UFSJ – também
conhecido como Solar da Baronesa, Praça
Dep. Augusto das Chagas Viegas, 17, Largo do Carmo, São João Del Rei - MG
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MATOS, Sara Antónia. Religare. In Catálogo Três Poéticas
Dissonantes. Escultura Portuguesa Contemporânea. Galeria Instituto de Artes -
UNESP/SP, 2012.
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